Revista do Vestibular da Uerj
Uerj DSEA SR-1
Rio de Janeiro, 28/03/2024
Ano 12, n. 32, 2019
ISSN 1984-1604

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Artigos

Não tem mistério, está no edital: uma orientação para a prova de Redação, por Caroline Martins & Juliana Rettich

Ano 12, n. 32, 2019

Autor: Caroline Martins & Juliana Rettich

Sobre o autor: Caroline Martins é professora de Português da rede privada, Bolsista Proatec do Programa de Leitura da UERJ e mestre em Linguística pela UERJ. Juliana Rettich é professora de Português da rede privada, professora substituta do departamento de Linguística da UERJ, mestre em Linguística pela UERJ e doutoranda em Linguística também na UERJ.

Publicado em: 31/08/2020

Os temas das provas de redação no vestibular da UERJ apresentam possibilidades de respostas norteadas pelo posicionamento do candidato, diferentemente dos temas elaborados pelo Enem, cuja frase-tema apresenta um problema ora implícito, ora explícito, com abordagem direcionada pela coletânea, ficando ao estudante a função de constatar esse problema, analisar suas causas e apresentar soluções. Nesse sentido, é possível declarar que a prova de redação do vestibular da UERJ revela uma preocupação com a capacidade argumentativa do(a) candidato(a), uma vez que não há uma única abordagem a defender, como acontece no Enem, precisando o(a) estudante refletir sobre o seu posicionamento e defendê-lo a partir das suas perspectivas e suas experiências no mundo – o que lhe traz a possibilidade de se colocar como um sujeito ativo no processo de feitura da redação. Vejamos um exemplo da diferença entre os temas dessas duas provas:

1) a verdade pode ser estabelecida com base em uma única perspectiva? (Vestibular UERJ 2018)

2) Democratização do acesso ao cinema no Brasil (Enem 2019)

No primeiro tema, é possível escrever um texto a partir de três respostas possíveis a serem dadas à pergunta feita no tema da UERJ 2018: sim, é possível estabelecer a verdade com uma única perspectiva; não, não é possível; depende. Se você buscar a resposta-padrão, o gabarito, divulgada no site Vestibular UERJ, após a aplicação dessa prova, verá que a banca apresenta essas três possíveis respostas. Já no segundo tema, o do Enem 2019, poderíamos até dizer que seria possível escrever uma redação em que nos posicionemos sobre democratizar ou não o cinema. No entanto, ao exigir que sejam dadas soluções a um problema, o estudante precisa identificar, como já dito neste artigo, esse problema – que fica bem evidenciado pelo conteúdo presente na coletânea: o acesso ao cinema no Brasil é pouco democrático. A partir dessa questão, a redação deve ser escrita, explicando as possíveis causas para tal quadro, a fim de dar soluções que minimizem a situação problemática no Brasil.

Voltando ao vestibular da UERJ, nos documentos anexos ao seu edital, mais precisamente no Anexo 6, há uma orientação geral sobre o conteúdo programático de Redação que se mostra importante, pois há ali a possibilidade de compreender o projeto pedagógico da coordenação acadêmica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a partir do qual é possível inferir a expectativa de um perfil de estudante para a universidade: alguém com posicionamento crítico e com capacidade para defendê-lo, por exemplo, em um texto argumentativo.

A prova de redação dá prioridade à capacidade de argumentação do candidato, entendendo-a como um importante requisito da vida acadêmica, quer pela articulação de informações e ideias, quer pelos exercícios de recursos expositivos e persuasivos da linguagem. Na Redação, serão avaliados a habilidade de leitura e interpretação para reconstrução de textos em diversos níveis, o domínio de gênero “dissertação”, a construção de argumentação, e o emprego de formas e estruturas linguísticas de acordo com a norma padrão.

Nesse caso, existem alguns pontos que são levados em consideração quando nos deparamos com textos que têm como base a tipologia argumentativa:

(i) Articulação de informações e ideias;
(ii) Recursos expositivos e persuasivos da linguagem;
(iii) Habilidade de leitura e interpretação para reconstrução de textos em diversos níveis;
(iv) Gênero dissertação;
(v) Construção da argumentação;
(vi) Norma padrão.

Pensamos, então, que esses pontos levantados podem ser agrupados em dois tópicos, a partir dos quais direcionaremos a nossa discussão acerca da redação no vestibular da nossa universidade. Na primeira parte, falaremos sobre: habilidade de leitura e interpretação para reconstrução de textos em diversos níveis e articulação de informações e ideia, agrupando os tópicos (i) e (iii), compreendendo-os como parte de um processo anterior à escrita efetiva do texto na folha-resposta, ou seja, como a fase relacionada ao planejamento textual. Na segunda parte, pensando a escrita efetiva e o que entra em jogo nesse processo, falaremos sobre o gênero dissertação, com a construção da argumentação e o uso dos recursos expositivos e persuasivos da linguagem, a partir da exigência pela norma padrão – aqui ficam agrupados os tópicos (ii), (iv), (v) e (vi). Tal divisão pode nos levar a pensar inclusive que, embora dividamos em duas partes o processo de escrita, essas duas partes estão intrinsecamente relacionadas, uma vez que a reflexão acerca do texto não se encerra no planejamento textual. Enquanto escrevemos, damos formas às ideias que pensamos anteriormente, continuando a pensar quais melhores expressões se adequam ao que queremos transmitir ao interlocutor. Isso pode nos trazer também a importância de, àqueles(as) que fazem o rascunho, ficarem tranquilos(as) quando fazem modificações no texto ao passarem a limpo para a folha-resposta. Mas este é um tópico que pode ser desenvolvido em artigos posteriores. Por ora, ficamos com a divisão mencionada.

1. Habilidade de leitura e interpretação para reconstrução de textos em diversos níveis e articulação de informações e ideia

Decidimos manter o tópico tal como aparece no edital, a fim de elucidar o que apresentamos no título: não tem mistério, está no edital. Vamos pensar aqui, então, no seguinte: como escrever uma redação que deixe esses pontos bem evidentes? A clareza é parte fundamental da construção dessa resposta, que pode ter início, mas que, talvez, não se feche nesse texto.

Um dos critérios essenciais para uma boa dissertação é o de ela ser clara, de forma que seja lida por muitas pessoas, com distintas concepções de vida e posicionamentos, e seja compreendida. Muitas vezes, há uma confusão em relação a isso, porque existe a crença de que um bom texto para o vestibular é aquele que tem uma escrita rebuscada, por vezes até incompreensível. Essa crença não faz sentido.

Primeiro porque o que se avalia no vestibular é a sua capacidade de escrita de acordo com o nível de escolaridade em que você está – ou seja, exige-se um texto que seja possível para estudantes que completaram o ensino médio, já que esse é o perfil médio de candidatos(as) que estão tentando o vestibular. Com isso, tudo bem se você não escreve de modo rebuscado, não usa expressões como imbróglio, insofismável, fulcral, dessarte, destarte, entre outras.

Segundo porque parece que a preocupação de escrever uma redação para uma banca que te falaram ser mais exigente faz com que você, buscando usar expressões ou construir frases que não têm a ver com seu estilo de escrita, produza um texto que nem você nem a pessoa que avalia compreende.

É importante reforçar também que compreender não é concordar; o avaliador não precisa concordar com o posicionamento levantado no texto para reconhecer que ele é claro. E, para isso, pensar antes de começar a escrever e ter um roteiro em seu rascunho tendem a ser ações fundamentais antes de partir para a feitura definitiva da redação na folha da prova.

No caso de um tema que não apresente um único caminho argumentativo para seguir, a tomada de posicionamento do(a) vestibulando(a), antes de começar a redação, é o primeiro passo para o roteiro do seu texto. É importante entender que você não deve pensar qual posicionamento que a banca teria, mas, sim, aquele que você segue e, por isso, terá certamente mais propriedade para defendê-lo – lembre-se de que isso é um importante critério de avaliação da banca. A partir de uma análise de temas anteriores das redações do vestibular UERJ, é possível perceber que os assuntos que estruturam os temas estão em disputa no campo social, o que torna essa tomada de posição mais difícil para alguns candidatos. “Crime”, “verdade”, “cidade maravilhosa”, “memória”, “literatura”, “ciência” — são assuntos que exigem uma reflexão sua e, assim, a definição clara, para você, do sentido dessas expressões, antes de respondermos a qualquer pergunta do tema ou elaborarmos qualquer outro posicionamento.

Se, em uma turma, perguntarmos qual é a concepção desses assuntos, ou seja, os seus significados, certamente teríamos respostas distintas. Então, um primeiro passo seria entender quais são as produções de sentido dessas palavras. Vejamos um exemplo a partir do tema de redação do vestibular de 2015:

É preciso levar em conta a leitura de literatura para avaliar a formação e os valores de uma pessoa?

Podemos pensar na nossa concepção de literatura e na relação dessa concepção com a formação de valores de uma pessoa, chegando ao seguinte posicionamento:

A literatura pode ser compreendida como um direito fundamental do ser humano, uma vez que permite ao indivíduo a suspensão de realidades, cada vez mais duras na nossa sociedade. Nesse sentido, a leitura de ficções é um dos pilares da avaliação da formação e dos valores de uma pessoa, pois é nessa suspensão do real que conseguimos projetar-nos a fim de construir nossas utopias.

Ou seja, a sua concepção das expressões da frase-tema, junto à resposta da pergunta desse tema, é a construção do seu posicionamento, visto que há uma disputa de sentidos do assunto em questão, ou seja, as pessoas veem literatura de formas distintas, bem como entendem o que são “formação e valores” de formas distintas, por exemplo. Quando você reflete e entende a forma como você concebe essas expressões, poderá, então, decidir a resposta para a pergunta feita pela banca: É preciso levar em conta a leitura de literatura para avaliar a formação e os valores de uma pessoa?

A partir dessas decisões, começamos a construção de nossa argumentação, articulando informações e ideias, já que, ao decidir nosso posicionamento, lançamos mão de conhecimentos prévios, ou seja, daquilo que trazemos ao longo da nossa formação não só escolar, como também às nossas outras experiências sociais. Nesse sentido, compreendemos que as habilidades de leitura e interpretação e articulação de ideias nos são desenvolvidas não apenas nas aulas de português, por exemplo, e precisam entrar em jogo ao lermos o tema de redação das provas de vestibulares. É como se dialogássemos com o tema, permitindo-nos acessar os conhecimentos que trazemos a partir da análise dos elementos linguísticos que compõem a frase-tema e o texto de apoio relacionado a ela – que desde o vestibular de 2018 da UERJ é composto pelo romance a ser lido para a feitura da prova de redação.

Feita a análise do tema, pensado nas ideias que podem estar em seu texto, articulando-as às informações que você traz, chega o momento de materializar tudo isso por meio da escrita. Essa materialização não é arbitrária, já que existe um gênero cobrado. Então, é preciso pensar nisso tudo sendo concretizado por meio das características discursivas inerentes ao gênero dissertativo-argumentativo, tanto no que se refere à sua forma global (introdução, desenvolvimento e conclusão), quanto aos elementos linguísticos do campo da argumentação.

2. Gênero dissertação: a construção da argumentação e recursos expositivos e persuasivos da linguagem

Reforçando essa lógica de entendimento dos temas apresentados na prova de Redação no Vestibular da UERJ, certamente uma das dificuldades dos(as) candidatos(as) está na incerteza sobre posicionar-se diante da questão proposta, considerando que se pode fazer as escolhas pessoais diante das possibilidades de sentido das palavras que compõem uma frase-tema.

Há, nesse sentido, a dúvida recorrente em relação a qualquer redação e, em particular, em relação à redação da UERJ: eu posso dar a minha opinião? Não apenas pode como deve, porque é o que se pede, se a dissertação é justamente a defesa de uma opinião. É comum uma mistura equivocada entre impessoalidade e imparcialidade. Essa dificuldade é o sintoma de um ensino voltado para a reprodução de conhecimento, e não para a produção de conhecimento. Assim, os(as) alunos(as) ficam querendo adivinhar o que a banca pensa acerca da verdade, da ciência, da moral etc., em vez de se permitirem questionar, duvidar e colocar essa dúvida, por meio de processo argumentativo, no papel.

Nessa tentativa infrutífera para adivinhar o pensamento dos corretores ou das corretoras, muitos jovens buscam fazer textos que agradem às bancas, estimulados(as) por frases comumente repetidas em salas de aula de preparação para o vestibular: “a UERJ gosta disso” ou a “UERJ não gosta disso”. Diante de afirmações que constroem um imaginário sobre essa banca, “como a UERJ gosta de Bauman ou de Foucault, cite-os na prova”, “a UERJ gosta de textos com metáforas”, “ a UERJ é muito rígida com a gramática”, por exemplo, o que temos são aulas de redação que acabam se constituindo como um processo mutilador de expressividade de pensamentos no texto dissertativo argumentativo, e poucos são os que se arriscam a escrever o que pensam, como pensam e por que pensam; a maioria reprime suas questões em nome de agradar um(a) leitor(a) ideal, rígido(a), pronto(a) para descer a nota da redação.

Há três anos, o vestibular da UERJ usa como base para sua prova de redação um livro literário. Dom Casmurro, de Machado de Assis, e O seminarista, de Rubem Fonseca, já foram obras abordadas. No ano de 2020, o livro foi Vidas Secas, de Graciliano Ramos. É muito comum alunos que estudam exaustivamente os modelos de prova para o Enem perguntarem insistentemente sobre a necessidade de ler uma obra literária para escrever uma redação para o vestibular, visto que não é obrigatório usar o livro em seu texto. Uma resposta simples e talvez mais interessante para um(a) aluno(a) tão preocupado(a) com respostas prontas, obrigatoriedades, modelos de textos, poderia ser: o tema da prova está no livro que você lerá.

Uma resposta que viria de uma segunda preocupação desse(a) aluno(a) sobre o critério avaliativo do uso de repertório sociocultural como acontece no Enem: o repertório sociocultural pode ser retirado do livro, mesmo que não haja necessidade, pois, se entendemos que não existe originalidade depois de Adão, tudo o que vier a ser enunciado já foi dito antes. Assim, escrevemos sempre com base em outros textos, ou seja, nenhum texto é escrito sem base em algum repertório. Respondidas, as questões sobre o livro podem ganhar discussões mais profundas quando relacionadas à construção da argumentação. Afinal, colocaremos em prática nossa habilidade de leitura e interpretação para a reconstrução de textos em diversos níveis; articularemos informações e ideias; além de lançarmos mão de recursos expositivos e persuasivos da linguagem.

Como podemos pensar no livro para nossa argumentação? Considerando nossa habilidade de leitura e interpretação para formular nossos argumentos nessa prova, a verossimilhança se mostra como um elemento importante, uma vez que abre a possibilidade de relacionarmos ficção e realidade. Essa relação traz uma ferramenta eficaz na construção de uma argumentação: comparação. Relacionar ficção e realidade é estabelecer comparações, que podem ser construídas através de pontos comuns ou até mesmo distintos.

É muito comum que estudantes, em vez de fazerem suas leituras, fiquem dependentes das análises de professores de preparatórios para vestibulares. Essa dependência acaba sendo um erro, pois a análise será do professor(a), não de quem fará a prova — nesse sentido, o ponto de vista da pessoa que escreverá a redação já fica antecipadamente precário, porque ela terá de falar sobre um tema, posicionando-se, sem partir da sua percepção acerca dos personagens e das situações narradas no livro. É claro que as análises vistas em sala contribuem para as suas reflexões e até para o amadurecimento de determinados posicionamentos que você tem, o problema é quando se acredita que basta ouvir o que diz o(a) professor(a) e seguir, sem criticidade, o que ele(a) fala, sem abrir espaço para um pensamento autônomo que contribua para uma escrita também autônoma. Ou seja, a reflexão do(a) professor(a), a partir da leitura que ele(a) faz do livro, não pode ser encerrada por ela mesma, sem que você dê importância a sua reflexão.

Assim se explica, infelizmente, a “coincidência” de relações feitas, em inúmeras redações que nos foram apresentadas por nossos alunos e nossas alunas, entre Macabéa, de A hora da estrela, e Fabiano, de Vidas Secas, ou entre Fabiano e o poema “O bicho”, de Manuel Bandeira. Não nos surpreendeu descobrir que tais relações tinham sido feitas em aulas de redação disponíveis na internet. Qual é o problema dessas coincidências, ou seja, de tantas redações iguais entre si? Todas se desvalorizam, perante as(os) avaliadoras(es).

Voltando à comparação, vale recuperar a fala do professor Gustavo Bernardo em sua palestra sobre a redação do vestibular: a literatura é um exercício de tolerância porque te permite olhar o mundo pelas perspectivas dos personagens.

O que isso tem a ver com a comparação? Muita coisa. Sempre escrevemos um texto a partir das nossas experiências, atravessadas pelo que já lemos, analisamos, vivenciamos, conhecemos — tudo isso é repertório para produzir um texto, tudo isso forma as nossas maneiras de olhar o mundo, tudo isso forma a nossa perspectiva diante dos assuntos que nos são dados. Ao ler um livro, todos esses elementos entram em jogo e podemos relacioná-los aos elementos trazidos nas narrativas. Ao fazermos isso, um movimento cognitivo recorrente é a comparação com o que já trazemos das nossas experiências, ou seja, fazemos relações confrontando as nossas perspectivas com as dos personagens, que podem até nos proporcionar um exercício de tolerância e de potência de transformação.

Você pode se perguntar: como isso tudo entra no texto? No primeiro movimento, o de roteirização, você separou suas ideias, sabe de onde partirá sua perspectiva. Na escrita, isso se materializa com as expressões que você escolhe, aquelas capazes de marcarem sua opinião no texto, como os adjetivos, por exemplo. Toda essa bagagem que você traz, que chamamos de repertório, dá a você a condição de explicar seu posicionamento, utilizando-se de expressões explicativas, por exemplo, inserindo, a partir delas, fatos que contribuam para a solidificação do seu argumento, bem como elementos conclusivos que fechem o raciocínio construído nos parágrafos em que você defende seu ponto de vista. Isso quer dizer que seu conhecimento prévio sobre os textos argumentativos entra em cena também e devem ser usados por você a fim de escrever o gênero cobrado.

Para terminar, comentamos a prova de Redação do Vestibular 2020, realizada em dezembro de 2019. O tema da Redação partiu do romance Vidas secas, de Graciliano Ramos, e perguntava o que leva as pessoas, em condições semelhantes às do personagem Fabiano, a se considerarem inferiores às demais, isto é, a se considerarem “um bicho”?

A questão levantava uma breve discussão sobre servidão voluntária. Como um ser humano, uma nação, pode sofrer privações nas mãos de uma criatura? O que torna isso uma tradição? Qual tipo de vida têm aqueles que vivem para agradar o seu Outro?

Todas essas perguntas só serão respondidas, ou encaminhadas à reflexão, quando entendermos qual é “a condição de Fabiano” para cada um de nós. O que mais vemos e lemos os leitores de Vidas Secas apresentarem como condições de Fabiano é a precarização, a miséria... Entretanto, levantamos a possibilidade de olharmos, a princípio, essa condição não somente como uma precarização. Nesse sentido, Fabiano é, antes de tudo, um forte: inteligente, sagaz, sobrevivente. Mas, por viver numa sociedade que o discrimina e o diminui pela cor, pela condição econômica, pelo ambiente em que vive, é colocado dentro dessa condição precarizada. A precarização elaborada por um Outro estabelece uma condição de miséria e o faz se sentir miserável, eterno servo desse Outro.

A partir da possibilidade de leitura que levantamos sobre a condição de Fabiano, tentamos deixar claro como a construção de um posicionamento “honesto” não depende de uma citação solta ou do que pensa seu professor, mas depende sim de sua própria leitura de mundo: o que você vive? Onde vive? Como vive? Diante dessas perguntas, quais são as relações possíveis que você pode fazer com os personagens que você mesmo(a) encontra pelo caminho?

São respostas que deixamos para você dar a si próprio(a). Suas redações não precisam ser uma grande verborragia de coisa nenhuma que não tenha sido dita e/ou pensada por você. O texto é uma prática social, é o resultado do sujeito que você é neste mundo em que se dá a sua existência — não tem por que você não se permitir aparecer naquilo que você escreve.

 

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